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saraupairinstates



Sexta-feira, 03.12.04

Adeus...

ADEUS, Eugénio de Andrade

Já gastámos as palavras pela rua, Meu Amor,
E o que nos ficou não chega
Para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
Gastámos as mãos à força de as apertarmos,
Gastámos o relógio e as pedras das esquinas
Em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
Era como se todas as coisas fossem minhas:
Quanto mais te dava mais tinha para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes
E eu acreditava.
Acreditava,
Porque ao teu lado
Todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
Era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
Era no tempo em que os meus olhos
Eram realmente peixes verdes.
Agora são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
Uns olhos como os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor
Já não se passa absolutamente nada.
E, no entanto, antes das palavras gastas
Tenho a certeza
Que todas as coisas estremeciam
Só de murmurar o teu nome
No silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
Não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.


Quando a minha Mãe me mostrou este poema do Eugénio de Andrade, eu Adorei-o logo, de uma forma meio infantil: queria arranjar um namorado de olhos verdes, para, quando a nossa relação acabasse, eu mandar-lhe uma carta com isto escrito.

Eu já senti o Amor descrito neste poema, há uns anos atrás, por breves meses. O que ficou foi exactamente isto.

Agora, em vez de ter vontade de arranjar um namorado para dar este poema no fim, gostava de ter um namorado para sentir e partilhar o Amor por trás desta despedida.

Mas, se toda a gente tivesse aquilo que quer, isto deixava de ter piada.
Vou-me contentando com a vida que tenho(mais ou menos).

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por foreverthirtyfive às 20:51


9 comentários

De Susana a 04.12.2004 às 11:30

"(...) Deixa dizer-te os lindos versos raros/que a minha boca tem pra te dizer!/São talhados em mármore de Paros/cinzelados por mim pra te oferecer./Têm dolência de veludos caros,/são como sedas pálidas a arder.../Deixa dizer-te os lindos versos raros/que foram feitos pra te endoidecer!/Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda.../Que a boca da mulher é sempre linda/se dentro guarda um verso que não diz!/Amo-te tanto! E nunca te beijei.../E nesse beijo, Amor, que eu te não dei/guardo os versos mais lindos que te fiz!(...)" - Florbela Espanca
Todos temos um verso para dar e outro para receber, cabe a cada um saber esperar e distinguir por entre a multidão quem merece o nosso verso, o que é muito mais difícil, mas como dizem os antigos "Cada panela tem a sua tampa", por isso resta-nos a tranquilidade de saber esperar e a capacidade de amar quando aparece na nossa vida quem nos mereça.. ;) E como já me alonguei demais neste comentário, um beijinhos para ti.. ;)

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